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Complicações neonatais onfalógenas – relato em um bovino

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Revista Agrária Acadêmica

agrariacad.com

doi: 10.32406/v7n1/2024/106-115/agrariacad

 

Complicações neonatais onfalógenas – relato em um bovino. Omphalogenic neonatal complications – report in a bovine.

 

Mazurquiedisk Nunes Rosa Júnior1, Ana Luíza Bernardes Pavan1, Gabriela Oliveira Lamarca da Silva1, Mariana Melo Ferreira Arantes1, Vitor Foroni Casas2, Simone Bonattini Martinez3, Lívia Maria Barbosa de Andrade4, Lucas de Freitas Pereira2

 

1- Médico(a) Veterinário(a) – Universidade de Franca – UNIFRAN, Campus Franca – SP, Brasil. E-mail: vet.mazurnunes@gmail.com.
2- Docente do Curso de Medicina Veterinária – Universidade de Franca – UNIFRAN, Campus Franca – SP, Brasil.
3- Médica Veterinária Autônoma – Franca – SP, Brasil.
4- Mestranda, Universidade de São Paulo – USP.

 

Resumo

 

Os cuidados com o animal recém nascido são importantes, pois estão vulneráveis. Um adequado e epecífico manejo até o desmame exige cuidados sanitários no momento do nascimento, sendo a cura do umbigo e a oferta de colostro medidas fundamentais para assegurar a imunidade. As patologias onfalógenas acarretam desde afecções brandas até problemas gravesm como sepse, colocando em risco a vida do bezerro. Como medidas adotadas para evitar doenças onfalógenas, devem-se atentar aos cuidados com limpeza e antissepsia do cordão e local onde o animal seguirá alojado, devendo ser limpo e seco. O estudo relata o caso de um animal com hérnia e infecção umbilical. Uma bezerra, com dois meses de idade, da raça Girolando, encaminhada ao Hospital Veterinário de Franca (UNIFRAN), com aumento de volume na região, anorexia, apatia, taquipneia e tosse. Como conduta clínica foram realizados exames clinicos, auxiliares de imagem e hematológicos, onde os exames sugeriram múltiplos abcessos intracavitários. O tratamento clínico instituído foi à base de antibióticos, antiinflamatórios, broncodilatadores, terapia de suporte e curativos diários do cordão umbilical. Estas condutas visaram melhora da infecção e reestabelecimento dos problemas respiratórios. Após a melhora do quadro clínico, o animal foi submetido à cirurgia para correção da hérnia umbilical, com sucesso no procedimento realizado. No pós-operatório o animal apresentou-se bem, foi medicado com antibióticos, complexos vitamínicos e antiinflamatórios, após 21 dias da realização da cirurgia, recebeu alta hospitalar. Na propriedade o animal teve recaída clínica resultando a morte decorrente de septicemia.

Palavras-chave: Cuidados com neonato. Septicemia. Umbigo.

 

 

Abstract

 

Care for newborn animals is important, as they are vulnerable. Adequate and specific management until weaning requires health care at the time of birth, with healing of the navel and the supply of colostrum being fundamental measures to ensure immunity. Omphalogenic pathologies range from mild conditions to serious problems such as sepsis, putting the calf’s life at risk. As measures adopted to prevent omphalogenic diseases, care must be taken to clean and antisepsis the cord and the place where the animal will continue to be housed, which must be clean and dry. The study reports the case of an animal with a hernia and umbilical infection. A two-month-old Girolando calf, referred to the Franca Veterinary Hospital (UNIFRAN), with increased volume in the region, anorexia, apathy, tachypnea and cough. As clinical management, clinical, imaging and hematological tests were carried out, where the tests suggested multiple intracavitary abscesses. The clinical treatment instituted was based on antibiotics, anti-inflammatories, bronchodilators, supportive therapy and daily dressings of the umbilical cord. These measures aimed to improve the infection and restore respiratory problems. After the clinical condition improved, the animal underwent surgery to correct the umbilical hernia, with the procedure performed successfully. Post-operatively, the animal performed well, was medicated with antibiotics, vitamin complexes and anti-inflammatories, and was discharged from hospital 21 days after the surgery. On the property, the animal had a clinical relapse resulting in death from septicemia.

Keywords: Neonate care. Septicemia. Navel.

 

 

Introdução

 

A criação de bezerros exige cuidados e manejo específicos que vão desde o nascimento até o desmame (COELHO, 2005). O período neonatal dos bovinos é delicado, sendo o índice de mortalidade alto na primeira semana de vida. Ainda assim, falhas durante esta etapa pode acarretar prejuízos de até 75% no processo produtivo (PRESTES; LANDIM-ALVARENGA, 2006).

Diferentes tipos de distúrbios estão envolvidos com mortalidade perinatal, dentre os não infecciosos cita-se anormalidades cardiovasculares, pulmonares, incapacidade termorreguladora, hipoglicemia e alterações associadas a partos distócicos (VAALA; HOUSE, 2006; PRESTES; LANDIM-ALVARENGA, 2006). Entretanto, causas infecciosas merecem destaque dentre as causas de mortalidade neonatal, sendo as onfalopatias uma das principais responsáveis por alavancar este índice (DONAVAN et al., 1998). Os nenonatos da espécie bovina que desenvolvam onfalopatias, geralmente tiveram falhas no manejo com os mesmos, além de deficiência na higiene do local do parto, sendo estes, fatores associados a processos inflamatórios e infecciosos que acometem as estruturas umbilicais (RADOSTITS et al., 2002; SILVA, 2022).

O tratamento para as onfalopatias são feitos de formas diferentes entre os casos mais leves e os mais severos, sendo escolhidos tratamentos clínicos para os mais brandos e os mais severos precisam de abordagem cirúrgica, que são feitas através de celiotomia e exérese dos tecidos umbilicais afetados juntamente com a correção de hérnia umbilical quando preciso (SILVA, 2022).

O cordão umbilical é uma estrutura exposta à contaminação por microrganismos patogênicos, porém este fato é ainda negligenciado por muitos (BELANGER, 2008). Nos bovinos, esta estrutura é formada por três estruturas, sendo uma veia, por onde passa o sangue com oxigênio e nutrientes e duas artérias, ramos da artéria ilíacas internas, que levam o sangue pobre em oxigênio, além do úraco, responsável pela comunicação entre a bexiga do embrião e o saco alantóide da placenta (SILVA, 2022).

Os cuidados iniciais do neonato são necessários para reduzir significativamente a casuística de doenças e o índice de mortalidade nestes animais (BELANGER, 2008). Faz-se necessário evidenciar que após o nascimento até o ressecamento umbilical, as estruturas que formam o umbigo são uma porta de entrada para micro-organismos que terão acesso direto à corrente sanguínea (SILVA, 2022).

Deste modo, o trabalho tem como objetivo elucidar a importância da atenção com o manejo do neonato bem como o cordão umbilical, e destacar os principais problemas oriundos decorrentes da falta destes cuidados.

 

Relato de caso

 

Uma bezerra fêmea, com dois meses de idade, da raça girolando foi encaminhado ao Hospital Veterinário de Franca (UNIFRAN) com aumento de volume na região umbilical, anorexia, apatia, taquipneia e tosse produtiva. Segundo o proprietário, o animal nasceu com oito meses de gestação, de parto normal, ingeriu colostro na quantidade indicada, realizou-se a cura do umbigo, em sequência foi retirada da mãe e alocada em local adequado destinado a bezerros, a partir de então, desde o primeiro dia, amamentada com mamadeira na quantidade de 4 litros de leite por dia dividido em duas porções.

Após alguns dias o animal começou a manifestar respiração ofegante, tosse produtiva, aumento de volume na região umbilical, ausência de coaptação e aspecto amolecido das estruturas umbilicais. Diante disso, foram utilizadas ainda na propriedade as seguintes medicações: sulfadoxina (12mg/kg), com trimetropim (15mg/kg) e piroxicam (0,3mg/kg) EV/SID por 4dias; posteriormente a este período foi feito benzilpenicilina procaína (20.000 UI/kg) com diidroestreptomicina (12,5mg/kg) IM/SID por mais 3 dias. No décimo dia foi administrado benzilpenicilina benzatina (20.000 UI/kg) IM/SID a cada três dias. Sem melhora clínica o animal foi encaminhado para Hospital Veterinário.

No exame clínico, observou-se frequência cardíaca (FC) de 160 batimentos por minuto (bpm), frequência respiratória (FR) 88 movimentos por minutos (mpm) e crepitação pulmonar evidenciados nos lobos caudais, temperatura retal (TR) 39,8°C, mucosas normocoradas, tempo de preenchimento capilar (TPC) de 3 segundos. Na palpação abdominal observou-se aumento de volume de consistência firme na região umbilical, presença de hérnia, estruturas umbilicais friáveis sem continuidade com meio externo, odor fétido, coloração esbranquiçada e amolecida do segmento interno.

Na ultrassonografia abdominal as imagens sugeriram áreas com aspectos de conteúdo purulento na região interna das estruturas umbilicais, que se assemelham a onfaloflebite e também presença de abscessos em lobos hepáticos (Figuras 1 e 2).

 

Figura 1 – Imagem ultrassonográfica do fígado de bovino, demonstrando áreas hiperecóicas com média de um centímetro cada (medidas 1, 2, 3 e 4) indicando presença conteúdo purulento na região interna do parênquima hepático, Fonte: arquivo pessoal.

 

O exame hematológico evidenciou intensa leucocitose, sendo que os valores de linfócitos e células segmentadas que estavam consideravelmente aumentadas, plaquetopenia e hiperproteinemia. A séria vermelha demostrou-se quase que na sua totalidade nos limites inferiores, sendo ligeiramente decrescidos a isto, os valores indicativos do tamanho e quantidade média de hemoglobina das hemácias (VCM e HCM respectivamente).

Com base nos exames clínicos e nos achados laboratoriais foram administrados benzilpenicilina potássica (20.000 UI/kg) + sulfato de gentamicina (2,2mg/kg) EV/ BID, ceftriaxona (25mg/kg) EV/SID, vitaminas do complexo B e hepatoprotetor EV/SID ambos por quinze dias consecutivos. Também foram utilizados cloridrato de bromexina (0,15mg/kg) EV/SID, flunixin meglumina (1,1mg/kg) EV/SID e inalação com solução fisiológica BID, ambos nos 5 primeiros dias, suplementação à base de ferro EV a cada cinco dias, e cloridrato de ranitidina (0,5mg/kg) EV/BID durante todo o tratamento, além de dipirona sódica (25 mg/kg) EV quando na presença de febre. O curativo do umbigo foi realizado diariamente com sonda uretral de tamanho 6 + solução fisiológica + iodo polivinilpirrolidona tópico, onde era introduzido no orifício do umbigo e administrado a solução. A alimentação foi feita com a oferta de leite integral na quantidade de 4 litros ao dia dividido em duas vezes, além de feno e ração e água ad libitum.

 

Figura 2 – Imagem ultrassonográfica de fígado de bovino demostrando presença de pontos hiperecóicas demostrando múltiplos abcessos em lobos hepáticos (1 e 2) com mensurações de aproximadamente 1,4 centímetros, Fonte: Arquivo pessoal.

 

Após o período de tratamento o animal apresentou episódios recorrentes de timpanismo, sendo necessária sondagem nasogástrica, administração de antiespumante (ruminol®) 20ml diluído 0,5l de água morna, também foi feito promotores de crescimento (biobac®) 4g/VO em dias alternados durante duas semanas.

Um mês após o encaminhamento do animal houve melhora no quadro clínico pulmonar e da infecção na região umbilical. Deste modo optou-se pelo procedimento cirúrgico para correção da hérnia umbilical e para a possível retirada de abcesso na região interna correspondente.

Para a realização do procedimento utilizou-se xilazina a 2%, na dose de 0,1 mg/kg como medicação pré-anestésica conforme recomendado por Ribeiro et al. (2010), sendo a indução anestésica com propofol 2mg/kg e midazolam 0,1 mg/kg, e a manutenção foi feita com isoflurano (HENDRICKSON, 2010). Para a cirurgia respeitou-se todos os protocolos de antissepsia preconizados. Foi realizada incisão longitudinal na linha média, cranial ao saco herniário, a cavidade foi acessada e o conteúdo encapsulado no cordão umbilical foi circundado em elipse de modo a acompanhar todo anel herniário, toda a estrutura foi retirada com posterior ligadura. Ato contínuo foi possível observar a presença de múltiplos abscessos disformes, de tamanhos variados entre 1,5 e 4 centímetros, difusos pela cavidade, aderidos entre peritônio, parede abdominal, omento, parede ruminal e lobos hepáticos. Na impossibilidade da exérese dos abcessos, a parede abdominal foi suturada concomitante a correção hernial, o fechamento da cavidade seguiu os preceitos da técnica de herniorrafia.

No pós-operatório foram utilizados belzilpenicilina potássica (20.000 UI/kg) + sulfato de Gentamicina (2,2 mg/kg) EV/BID; protetor hepático EV/SID; cloridrato de ranitidina (0,5 mg/kg) EV/SID; complexo vitamínico EV/SID ambos durante 12 dias, sendo que nos quatro dias iniciais utilizou-se cetoprofeno (3mg/kg) intercalado com dipirona sódica (25 mg/kg) EV/SID. Do 13º ao 20º dia administrou-se enrofloxacina 2,5 mg/kg VO/SID. O uso da dipirona sódica na dose supracitada foi feito quando necessário. Ainda assim, antissepsia e curativo da ferida durante todo o período de pós-operatório até a retirada dos pontos cirúrgicos.

Aos 21 dias de pós-operatório o animal recebeu alta, bem como, as orientações sobre os cuidados a serem adotados. No local o animal ficava em local com outros bezerros.

Após noventa dias, o animal veio a óbito, segundo o proprietário o animal amanheceu morto. Na necropsia, havia presença de múltiplos abcessos espalhados na cavidade e órgãos abdominais, presença de líquido na cavidade abdominal, petéquias na mucosa ocular, linfonodos inguinais e pré-escapulares aumentados de tamanho.

 

Resultados e discussão

 

Segundo Spadetto e Tavela (2013), o sucesso na criação de bezerros só e possível com boas práticas de manejo, que se inicia ainda no pré-parto com as vacas gestantes. Costa e Silva (2011) citam que o local deve ser calmo afastado de outros animais, limpo e seco, boa cobertura vegetal, alimento e água abundante de fácil acesso. Neiva (2000) também relata que tal ambiente deve apresentar uma área de 2,3 m² por animal. No entanto, não seguindo as orientações indicadas por estes autores, o nascimento do animal descrito ocorreu em um local que não havia a separação entre as fêmeas que estavam prenhes.

Costa e Silva (2011) mencionam que após o nascimento os neonatos devem ser transferidos para um local limpo e apropriado, evitando problemas de contaminação principalmente do cordão umbilical. De acordo com a anamnese, e informações colhidas com o proprietário, às medidas profiláticas existentes na propriedade não são equivalentes às preconizadas por alguns autores, onde, o excesso de umidade e a falta de segregação são fatores associados ao desenvolvimento de agentes causadores de doenças, como diarreia, problemas respiratórios e afecções umbilicais, comuns nos três primeiros meses de vida do animal (CAMPOS; CAMPOS, 2004).

Como citado por Diniz (2017), os neonatos dependem do consumo do colostro em quantidade adequada logo nas primeiras horas após o nascimento para adquirirem imunidade passiva, o que para Signoretti (2018), é o equivalente a 10% do peso corporal do recém-nascido. De acordo com Feitosa (1999), o fornecimento do colostro da primeira ordenha deve ser feito dentro das primeiras seis horas após o nascimento, na quantidade de 10 a 15%/PV (cerca de quatro litros). Deste modo, o proprietário afirmou que o animal deste caso ingeriu quantidade suficiente para garantir a proporção indicado, relatou ainda, que deixou o animal junto com a mãe após o nascimento e o viu realizando a mamada. Cabe ressaltar que o fato de deixar o animal junto com a mãe, não garante a ingestão adequada ou até mesmo a ingestão de colostro. Neste sentido, Godden (2008) descreve que o não acompanhamento do bezerro na hora da mamada do colostro não garante que o neonato tenha ingerido a quantidade correta de colostro, o que favorece a falhas na transferência de imunidade passiva.

McGuirk (2003) reforça que a concentrações de PPT (proteína plasmática total) maiores que 5,5 g/Dl indicam sucesso na transferência de imunidade passiva. Como no presente trabalho não foi mensurado a qualidade do colostro da mãe, não é possível falar que houve correta absorção de imunoglobulinas.

Após o nascimento do bezerro é necessário à cura da parte exposta do resquício do cordão umbilical, que segundo Coelho (2005) deve ser feita com solução de tintura de iodo (7 a 10%). Radostits et al. (2002) citam que altas concentrações de iodo são eficazes para esta finalidade, porém cuidados devem ser adotados para não lesionarem a pele tecidos adjacente. Rehagro [s.d.] reforça a importância do uso de substâncias que contenha iodo na sua composição, que atua como antisséptico favorecendo a mumificação e queda da parte que fica em contato com o meio externo.

No animal deste trabalho, embora a correta realização do curativo desta estrutura acredita-se que, a parte que ficou exteriorizada no momento da ruptura ficou pequena, não permitindo adequada distribuição e absorção do iodo ao longo do cordão. Assim não permitindo a dessecação de partes mais internas dos vasos umbilicais, uma vez que o aspecto destes segmentos era friável e úmido. Ainda de acordo com Figueiredo (1999), em condições normais de parto, junto com a ruptura do cordão umbilical em tamanho normal e condições de sanidade favoráveis, ocorre a secagem após 8 a 10 horas, e a mumificação por volta de 10 dias pós-nascimento.

Considera-se também que o nascimento pré-maturo não permitiu o fechamento adequado da musculatura abdominal, que além da hérnia contribuiu para ruptura e involução inadequada do cordão, favorecendo inflamação seguida de infecção ascendente das estruturas adjacentes. De acordo Hickman e Walker (1983) relata que infecção em estruturas umbilicais remanescentes prejudicam o fechamento da linha alba na conexão abdominal no funículo umbilical, favorecendo a ocorrência de hérnia umbilical.

De acordo com Teixeira (2018), as onfalopatias estão entre as principais enfermidades que acometem os neonatos e dentre suas consequências cita-se: poliartrite, cistite, pneumonia, abscessos hepáticos, renais e septicemia, o que pode explicar a observações de inúmeros abcessos dispostos na cavidade abdominal tanto cirurgia como na necropsia (RADOSTITS et al., 2002).

Bittar e Paula (2010) citam que aumento de volume no umbigo, dor a palpação e presença de secreção purulenta, são sinais de infecção e tais alterações foram observadas no animal deste estudo. Ainda neste sentido, Garcia et al. (1996) menciona secreção, edema, sensibilidade e aumento de temperatura. Tais alterações observadas neste estudo corroboram com ambos. No entanto, Ogilvie (2000) adverte que a ausências de sinais externos de acometimento umbilical não exclui o diagnóstico de comprometimento umbilical, sendo o exame ultrassonográfico e palpação abdominal importantes métodos auxiliares no diagnóstico.

A opção de laparotomia para correção hernial seguiu as indicações de Andrews et al. (2008). Eles mencionam que hérnias maiores que quatro centímetros concomitantes com infecções intra-abdominais necessitam de intervenção cirúrgica. Entretanto, Alonso et al. (2017) descrevem que o tratamento clínico com antibioticoterapia antes e após a cirurgia, se faz necessário. Para isso alguns autores descrevem que o uso de penicilina é uma opção efetiva (ANDRADE, 2008). Respeitando estas condutas, tanto o tratamento clínico quanto o procedimento cirúrgico foram instituídos.

Amaral et al. (2013) relatam que alguns casos o hemograma não revela características de animais com inflamação ou infecção das estruturas umbilicais e atribui isso à variação imunológica individual e o agente infeccioso envolvido, porém Silva et al. (2001) ressalta que o aumento de leucócitos não deve ser ignorado. Aumento da proteína total do líquido peritoneal também pode ser atribuído ao processo inflamatório e lesões hepáticas (PEIRÓ et al., 2009). De encontro a alguns destes resultados, pode-se evidenciar aumento de leucócitos (linfócitos e segmentados), aumento de proteínas totais bem como aspartato aminotransferase (AST). Provavelmente devido à cronicidade do processo infeccioso e ao dano hepático.

O tratamento para correção de hérnias umbilicais é conhecido na literatura (HENDRICKSON; BAIRD, 2013), sendo duas técnicas descritas: aberta e fechada ambas com graus consideráveis de sucesso (ORTVED, 2017). No animal descrito, optou-se pela técnica aberta, sendo o resultado tanto do procedimento quanto da recuperação, satisfatórios. A herniorrafia aberta foi escolhida para melhor inspeção dos abscessos, das vísceras bem como a retirada de estruturas remanescentes do cordão umbilical (PEEK; DIVERS, 2018). As desvantagens desta técnica é que casos de aderência intestinal podem proporcionar peritonite (HENDRICKSON; BAIRD, 2013; ORTVED, 2017).

Taylor (2015) descreve que a síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS) é resultante da inflamação causada por agentes infecciosos e não infecciosos. Quando esta síndrome é proveniente de infecção ela é denominada de sepse, e desencadeia diversas alterações sistêmicas como alcalose respiratória, aumento no consumo de oxigênio, acidose metabólica, hipoperfusão e hipotensão sistêmica, diminuição do oxigênio tecidual e ativação da cascata de inflamação. Estas alterações sistêmicas proporcionam piora do quadro clínico e aumenta o risco de morte (PEREIRA JUNIOR et al., 1998). Neste estudo, a possível piora clínica que culminou com a morte do animal após a alta hospitalar provavelmente foi decorrente de sepse.

 

Considerações finais

 

A falta de cuidados com bezerros recém-nascidos e cura incorreta do cordão umbilical acarreta sérios agravos a saúde dos animais. Como consequência, há acometimentos das estruturas envolvidas com o cordão umbilical, como fígado, rim e outros órgãos e cavidades. Como consequências observam-se hérnias umbilicais, abcessos hepáticos e septicemia. Em alguns casos o tratamento clínico e até mesmo cirúrgico se faz eficiente. Quando há presença de abcessos e comprometimento sistêmico, o tratamento pode auxiliar na sobrevida do animal, contudo a sepse é comum em processos infeciosos pode levar o animal a morte.

 

Conflitos de interesse

 

Não houve conflito de interesses dos autores.

 

Contribuição dos autores

 

Mazurquiedisk Nunes Rosa Júnior – ideia original, leitura, interpretação dos trabalhos escritos e escrita; Ana Luíza Bernardes Pavan – leitura dos trabalhos, escrita e correções; Gabriela Oliveira Lamarca da Silva – correções; Mariana Melo Ferreira Arantes – correções; Vitor Foroni Casas – correções; Simone Bonattini Martinez – correções; Lívia Maria Barbosa de Andrade – correções; Lucas de Freitas Pereira – orientação, correções e revisão do texto.

 

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Recebido em 26 de outubro de 2022

Retornado para ajustes em 24 de janeiro de 2023

Recebido com ajustes em 29 de abril de 2024

Aceito em 30 de abril de 2024

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